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Democracia direta

2012-06-07 22:47 -0300. Tags: politics, em-portugues

Disclaimer: idéias mal-mastigadas follow.

Democracia vem em dois sabores: direta e indireta.

Democracia indireta, a.k.a. democracia representativa, é o que nós temos agora, e é o que as pessoas normalmente têm em mente quando falam de democracia: o povo elege representantes, que então votam nas leis e tomam a maior parte das decisões do estado. Qualquer pessoa pode se candidatar a representante (em geral), e os cargos são temporários, o que permite tirar do poder o camarada que não está agindo de acordo com as vontades do povo.

Democracia direta é em linhas gerais o que os inventores da palavra entendiam por democracia: o povo vota nas leis e toma as decisões do estado diretamente. O "governo" serve apenas uma função administrativa; o poder de iniciativa, isto é, de criação de leis e outras decisões, reside primariamente na vontade popular. A única nação moderna que pratica consistentemente uma forma parcial de democracia direta é a Suíça, onde referendos são obrigatórios para qualquer modificação à constituição e podem ser exigidos em outras situações, é possível propor modificações à constituição por meio de uma "iniciativa popular" (que exige a assinatura de 100 mil cidadãos para ser considerada e votada por referendo), e em algumas cidades as decisões locais são tomadas por meio de assembléia popular.

Eu não acredito em democracia indireta. O voto por representantes tem por conseqüência a necessidade de escolher um "pacote de propostas" na hora de votar. Nem sempre estamos de acordo com todos os pontos de um candidato (ou de qualquer um dos candidatos), e nem sempre há um candidato que defenda nossos interesses; em uma eleição, freqüentemente todos os candidatos são igualmente ruins, ou temos que votar no menos pior, e assim o mecanismo de substituição de representantes acaba trocando seis por meia dúzia. Além disso, os supostos representantes do povo freqüentemente tomam decisões que não têm qualquer embasamento na vontade popular, situação em que o povo precisa interferir nas decisões do governo de qualquer forma, por meio de protesto, o que nem sempre é efetivo.

Democracia direta tem alguns problemas práticos, dos quais o principal é a escalabilidade: em uma cidade de um milhão de habitantes, é inconveniente realizar uma assembléia popular para decidir a legislação. Uma possibilidade para contornar esse problema é ter assembléias locais em sub-regiões menores (com 50 ou 100 mil habitantes). Essas assembléias tomariam suas decisões e elegeriam um representante, sem poder de decisão próprio, mas com a função única de representar as decisões da assembléia em um "conselho" regional formado pelos representantes das diversas sub-regiões. É importante aqui que os representantes não tenham o poder de tomar decisões sem a aprovação popular. Outra maneira de aumentar a escalabilidade da participação é por meios eletrônicos, se pudermos garantir a segurança de uma votação pela Internet. Criptografia de chave pública seria suficiente, creio eu, se o governo tiver um registro das chaves públicas dos cidadãos (assim como tem um registro de RGs e CPFs); o problema seria garantir a anonimidade dos votos.

O meio-termo utilizado pela Suíça já seria um bom começo, e talvez fosse bom o suficiente. Ele é mais escalável do que um sistema totalmente direto, que talvez fosse mais problemático quando levado a nível nacional, especialmente em um país do tamanho do Brasil. Não vejo por que ter um país do tamanho do Brasil, entretanto; estou propenso a achar que o melhor seria dar autonomia total aos estados, e tornar a união entre os estados algo similar à União Européia.

Tenho que pensar melhor sobre tudo isso. Esse último parágrafo me fez parar para pensar por que é que alguma coisa não teria autonomia total em relação ao resto se assim quisesse, e.g., por que uma cidade teria que acatar as decisões do "nível hierárquico superior". Essa história de hierarquia nunca me foi muito palatável; mais sobre isso em outra ocasião. Comentário é bem-vindo.

Comentários / Comments (2)

lfz, 2012-06-08 19:13:07 -0300 #

Eu també simpatizo com o conceito de democracia direta e já pensei muito sobre o assunto. Como você também acho finalmente ela pode dar certo devido aos meios eletrônicos. Poderíamos ter referendos frequentes com um mínimo de votantes para serem validados (igual na Suíça) e sem voto obrigatório, mas com benefícios para quem vota como por exemplo descontos de imposto e coisas assim.

Particularmente acho que o maior benefício mesmo seria a maior conscientização e aproximação do povo com as questões políticas e sociais. Democracia indireta causa aquela sensação de que não podemos fazer nada a não ser no dia da eleição, enquanto um esquema como o citado anteriormente obrigaria todos (ou pelo menos um subgrupo que está preocupado em votar) a tomar as próprias decisões e se sentir parte da política.


Cayo, 2012-06-12 14:18:22 -0300 #

Essa de democracia direta não é pro Brasil<sub>2012</sub>. A galera é muito burra; um representante em teoria tem a vantagem de ser uma pessoa mais competente (rá rá). Também: versus democracia de povo desinformado ganha tirania bem-intencionada. O problema é encontrar o tirano ótimo. NP-baita-foda.


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