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Mecânica quântica

2012-04-28 00:15 -0300. Tags: physics, em-portugues

Desde o século 17 os físicos estavam se degladiando sobre a questão de se a luz é feita de partículas ou de ondas. Um experimento interessante feito no processo consiste em colocar uma barreira com duas fendas entre uma fonte de luz e uma superfície. O resultado não é meramente duas regiões iluminadas na superfície: o que se observa é um padrão de regiões iluminadas e escuras. A explicação é que as ondas de luz provenientes de cada uma das fendas interferem-se mutuamente, causando um padrão de reforço e cancelamento. Embora esse resultado aponte evidentemente um comportamento ondulatório, alguns outros fenômenos, como o efeito fotoelétrico, podiam ser mais bem explicados como a interação de partículas de luz com a matéria. No fim das contas, a galerinha concluiu que a luz é feita de pacotes de energia discretos (chamados quanta (singular quantum)), mas possui comportamento ondulatório.

A partir daí as coisas começam a ficar preocupantes. Em primeiro lugar (mas não necessariamente nessa ordem), descobriu-se que um experimento similar realizado com elétrons (um bicho que todos estavam de acordo que era uma partícula) também resulta em um padrão de interferência. Outros experimentos foram feitos com outras partículas, com resultados similares. Isto é, toda a matéria possui comportamento ondulatório. Ainda mais preocupantemente, um experimento similar em que é lançado um fóton (partícula de luz) de cada vez, de tal maneira que há probabilidade igual de cada fóton passar por cada uma das fendas, também produz um padrão de inferferência. Cada fóton individual interfere consigo mesmo. Mas como diabos, se cada fóton passa por apenas uma fenda?

Ou será que não passa? Para tentar resolver o mistério, realizou-se uma variação do experimento, com um detector próximo a cada fenda, de modo a determinar por qual fenda cada elétron individual estava passando. O resultado do experimento foi o seguinte: um, cada fóton individual de fato passava por uma única fenda; dois, na versão modificada do experimento, os fótons não formam um padrão de interferência: os fótons formam o padrão que se esperaria de partículas sólidas, atingindo duas regiões da superfície.

E é assim que funciona a porcaria: o fóton se comporta como uma onda enquanto ninguém está olhando, mas se alguém for ver por que fenda ele passa, ele decide passar por uma fenda ou outra, como uma partícula bem comportada.

A coisa fica um pouco pior, na verdade. É possível realizar o teste da fenda de maneira reversível. Ao invés de testar diretamente a passagem do fóton por cada uma das fendas, manipula-se o fóton de tal maneira que o spin do fóton é diferente dependendo de por qual fenda ele passou, e detecta-se o spin quando o fóton atinge a superfície. Se isso for feito, o fóton também se comporta como partícula, sem padrão de interferência; mas se no meio do caminho o fóton for manipulado de novo, de modo que o spin volte a ser o mesmo independentemente de por qual fenda o fóton passou, o padrão de interferência ressurge. O fóton, troll master, se comporta como se passasse por ambas as fendas, até que tenhamos como descobrir por qual ele passou, momento em que ele decide passar por apenas uma das fendas; mas se nós só ameaçarmos descobrir a informação e a atirarmos pela janela, ele novamente se comporta como se tivesse passado por ambas, mesmo depois de já ter teoricamente decidido passar por apenas uma fenda.

A teoria matemática da mecânica quântica prediz todos esses fatos; os experimentos foram feitos para confirmar se as predições da teoria estavam corretas, e estão. A teoria associa a cada partícula uma wavefunction, uma descrição ondulatória de seu comportamento. Não há consenso quanto a o que a wavefunction é fisicamente; o fato é que o quadrado da amplitude da wavefunction em um ponto do espaço representa a probabilidade de a partícula ser observada no ponto em questão. Fica a questão de por que sempre observamos uma partícula em um único ponto, se ela é de fato uma onda, e o porquê do comportamento probabilístico. A formulação matemática não informa nada disso; ela prediz o comportamento das partículas, e pronto. As equações não estão preocupadas com a interpretação física dos números.

Mas interpretações não faltam. A mais antiga, e certa vez mais aceita, e possivelmente ainda mais aceita, é a interpretação de Copenhagen. Segundo ela, a wavefunction é apenas uma descrição matemática, sem existência física, que descreve as probabilidades de se encontrar uma partícula em um dado estado. Quando a partícula é observada (e.g., detectada por um equipamento), ela imediatamete assume um estado único: a wavefunction colapsa, apresentando um pico no ponto onde a partícula é encontrada, e uma amplitude de zero elsewhere. Uma entidade se comporta sempre como uma partícula ou como uma onda, mas nunca como ambos.

Embora essa descrição se encaixe com os resultados dos experimentos, ninguém nunca ficou muito satisfeito com o colapso da wavefunction dependente de observação. Schrödinger (o camarada que descobriu a equação que descreve o comportamento da wavefunction ao longo do tempo) criticou a dependência de um observador, sugerindo o experimento mental conhecido como o gato de Schrödinger. A idéia é basicamente a seguinte: coloca-se um gato dentro de uma câmara isolada com um equipamento que mede um determinado evento quântico que tem igual probabilidade de ocorrer ou não ao longo de uma hora. Se o equipamento detectar o evento, ele parte um frasco de ácido cianídrico dentro da câmara, matando o gato. (Tal é a perversão das mentes que avançam a ciência.) A interpretação de Copenhagen, Schrödinger alega, leva à conclusão de que enquanto a caixa não for aberta (i.e., enquanto o ambiente não for observado), o gato estará em um estado sobreposto, vivo e morto ao mesmo tempo.

[Proibido jogar lixo e largar animais vivos e mortos neste local]
Puta que pariu, Schrödinger, atira mais um gato aqui e eu chamo a prefeitura

Se a interpretação de Copenhagen de fato diz isso é um ponto controverso. O que o experimento evidencia é que a noção de "observação" na interpretação de Copenhagen é vaga. Segundo alguns, a medição do evento quântico feita pelo equipamento já é suficiente para causar o colapso da wavefunction. (Além disso o gato está observando o ambiente, mas esse detalhe costuma ser ignorado. Ninguém se importa muito com o gato nessa história.)

A segunda interpretação mais aceita é a many-worlds interpretation. A many-worlds afirma que a wavefunction é real: ela é uma entidade física, não apenas um dispositivo matemático. De fato, segundo a many-worlds, a wavefunction de uma partícula é a partícula; não há nada na partícula que não seja descrito por sua wavefunction. A wavefunction é totalmente determinística (regida pela equação de Schrödinger), e não há colapso. Assim sendo, como se explica a observação de que partículas sempre se encontram em apenas um ponto quando observadas?

A idéia é a seguinte: no momento em que a partícula interage com o observador (e.g., o equipamento de medição), o estado de ambos se torna entrelaçado. Não faz sentido falar sobre o estado isolado de cada um dos sistemas (partícula e observador); só se pode falar de o estado de um relativo ao do outro: se a partícula tem um estado x, então o observador tem um estado y. Mas como todos os estados possíveis da partícula estão presentes na wavefunction, e a wavefunction é real, então todos os estados da partícula são reais em um dado momento. O que acontece é que quando observamos a partícula, o nosso estado fica entrelaçado com o da partícula, de modo que para cada possível estado da partícula (e.g., passar pela fenda da esquerda ou da direita), há um estado nosso correspondente (ter observado a passagem da partícula pela fenda da esquerda ou da direita). A implicação prática é que é como se para cada possibilidade existisse um universo paralelo, e em cada um deles houvesse um observador observando a partícula em um de seus possíveis estados. Trata-se, entretanto, do mesmo universo, com a wavefunction do observador entrelaçada com a da partícula, realizando todas as possibilidades do sistema. Os "mundos" só podem interferir um com o outro se o estado de todas as partículas for idêntico em ambos (i.e., quando deixam de ser múltiplos mundos). Em um sistema de escala sub-atômica isolado é possível que os estados divergentes da partícula convirjam no futuro (que é o que ocorre no experimento das fendas). Para sistemas maiores, a possibilidade de interferência é mínima, e diminui cada vez mais com o aumento da entropia (que a princípio é irreversível, embora não haja dados suficientes para uma resposta significativa).

Segundo a many-worlds, portanto, o gato está vivo e morto ao mesmo tempo, mas em "branches" diferentes da wavefunction; os branches estão entrelaçados com o outcome do evento quântico, e portanto o estado em que o evento ocorre está correlacionado com o estado do gato morto, e o estado em que o evento não ocorre com o gato vivo. Um observador externo sempre verá esses eventos correlacionados. Mas isso ocorre porque o estado do observador (ver o gato morto ou ver o gato vivo) também está entrelaçado com os estados da partícula e do gato.

Existem outras interpretações, mas essas são as que têm mais mind share entre os físicos. Não sou um grande conhecedor do assunto, e este post pode conter erros (ele pode estar correto em outro branch da wavefunction, se isso lhe serve de consolo). Minhas referências são a fonte de todo o conhecimento, um FAQ sobre a many-worlds (que a explica muito melhor do que qualquer outra coisa que eu tenha lido sobre ela), e um livrinho supimpa chamado The Fabric of the Cosmos.

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How to destroy the Earth

2012-04-15 23:07 -0300. Tags: physics, em-portugues

Certa vez um camarada mandou para a afamada Lista da Graduação da INF um link para uma página intitulada How to destroy the Earth:

This is not a guide for wusses whose aim is merely to wipe out humanity. [...] There are far more efficient ways of doing this, many which are available and feasible RIGHT NOW. Nor is this a guide for those wanting to annihilate everything from single-celled life upwards, render Earth uninhabitable or simply conquer it. These are trivial goals in comparison.

[...]

For the purposes of what I hope to be a technically and scientifically accurate document, I will define our goal thus: by any means necessary, to change the Earth into something other than a planet or a dwarf planet.

[...]

To be listed here, a method must actually work. That is, according to current scientific understanding, it must be possible for the Earth to actually be destroyed by this method, however improbable or impractical it may be.

O texto é bastante instrutivo. Altamente recomendável.

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