Ditas aquelas palavras de dúbio encorajamento, Evaristo, Ermenegildo e Eratóstenes desceram a verdejante colina em direção ao locus das festividades de equinócio. Desfrutaram em silêncio do banquete e da música por alguns minutos. Subitamente, uma suave e firme voz emanou de trás dos três magos.
"Vossa empreitada é nobre, mas fadada ao fracasso."
Os três viraram-se imediatamente. "O quê?", disse Evaristo.
"O Método", prosseguiu a voz, que pertencia a uma menina. "É uma medida desesperada, altamente falível e pouco eficiente, em circunstâncias normais."
"Quem és?", disse Eratóstenes. "Como sabes o que pretendemos? Como sabes a respeito do Método? És muito jovem para tais conhecimentos.
"Tenho precisamente a idade que preciso ter", replicou a menina. Os sábios, estupefatos e incertos acerca do significado de tal proposição, preferiram não questioná-la.
"E o que queres dizer com 'em circunstâncias normais'?", prosseguiu Evaristo.
"Quero dizer, obviamente, que precisamos criar circunstâncias anormais", respondeu a jovem, com uma expressão de profunda impaciência no rosto.
"'Precisamos'? Que parte tens nisso, ó, magnânimo ente, qual seja o nome pelo qual atendes?"
"A resposta, para mim que se auto-intitula Kira, é não-trivial, e mais facilmente demonstrada em toda sua glória do que descrita pelos pobres vocábulos do linguajar terreno. Vinde e mostrar-vos-ei!", disse a menina, e dirigiu-se para as bordas da citadela sem olhar para trás. Os três sábios a seguiram.
Depois de dez minutos de caminhada, chegaram a uma pequena construção de pedra. A menina abriu a porta e entrou sem qualquer cerimônia. Os sábios a seguiram. Kira entrou em um cômodo auxiliar. "Aguardai", disse. Brevemente, retornou ao salão principal portando uma caixa de pedra gravada com inscrições cuneiformes e pictogramas. "Acho que não se fazem necessárias maiores explicações", disse.
Os três, após um segundo de silêncio ante tamanha surpresa, exclamaram em uníssono: "A víscera de Ptolomeu!"
A menina esboçou um sorriso pela primeira vez desde o princípio da interação. Os sábios, afinal, sabiam alguma coisa.
"Precisamente", disse. Evaristo ergueu a tampa da caixa, e lá estava não outra coisa senão a mui lendária e elegante víscera, em toda sua pompa. Constatando a veracidade da relíquia, Evaristo pôs-se a recitar ciclicamente as antigas sílabas de pujança etérea, as quais Ermenegildo, Eratóstenes e Kira puseram-se a repetir, com um, dois, três versos de atraso, respectivamente:
"Muilarenda hwirkelende
Kaldaresta maigwerende
Skaldaranta nirmenasta
Faldamanda twirkelasta"
Ao final da oitava repetição da poderosa estrofe, a caixa tomou um branco incandescente, ergueu-se no ar, e preencheu a sala em um clarão ofuscante. Os quatro seguiram recitando em um tom mais alto, até que luz e som gradativamente esmaeceram-se, esmaeceram-se, e em uns poucos instantes a sala fez-se perfeitamente escura e silenciosa, e não mais havia nem caixa, nem sábios, nem menina, nem coisa nenhuma.
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